quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Útero




“Era uma casa muito engraçada/ Não tinha teto não tinha nada...” Vinicius de Moraes

Chove em Dourados. Parece que hoje (25/10), São Pedro abre as portas do céu, arrasta os móveis e lava sua digna residência. Mas pensando bem, acho que as águas que caem do céu não provem da faxina de são Pedro e sim de suas lágrimas. Lágrimas que escorrem pelo seu rosto quando compara sua confortável casa com a de seus irmãos terráqueos, localizados no continente americano, especificamente num país de dimensão territorial enorme, tendo seu desenho geográfico em forma de coração, ou seja, o Brasil, terra do samba do futebol...

O dono da chave do céu observa contriste a felicidade de brasileiros a contentarem-se com tão pouco ao receberem para habitar, determinados cubículos, que os insignes políticos teimam em chamar de casa. O velho Pedro paira sobre as alturas e de lá tudo vê, sabe que as coisas poderiam ser bem melhores. Sabe por exemplo como se perde pelo caminho parte do cimento, dos tijolos, da tinta, do telhado que realmente poderiam edificar uma verdadeira casa, mas não pode fazer nada, frente ao livre arbítrio do homem fica impotente, restando apenas lamentar que uns beneficiam-se da desgraça de outros. Desgraças de praticamente terem de viver com um parco salário mínimo para comida, água, luz, aluguel... Muitos morando em condições deploráveis em fundos de vales, margens de córregos. Desses lugares são retirados e colocados em locais um pouco melhor. No entanto, as lágrimas de Pedro é pelo que se pode fazer e não é feito, pois se levando em conta o dinheiro destinado a isso, podia-se esperar uma moradia mais digna, confortável, com espaço, pelo menos para respirar, trocar idéias e aconchegar descentemente uma família.

Para comprovar o que digo, basta visitar uma dessas casas. Mas tem de ir desacompanhado, pois a companhia corre o risco de ficar do lado de fora, tamanha é a casa. O desrespeito não para por ai, comparam a casa entregue com a incomensurável vida, como se ela pudesse caber dentro de um cubículo. O slogan “Minha casa minha vida” para um dos programas federais para habitação, parece restringir ainda mais os direitos de um contingente que ainda vive na vulnerabilidade social em detrimento a um limite estreito e caolho de uma política oportunista e deveras cruel, dissimulada em bom-mocismo.

Festeja-se a entrega das casas, as famílias que as habitarão são consideradas em situação de vulnerabilidade social, deve de ser por esse motivo que as casas são tão pequeninas... Tá bom assim...

Ah! Os residenciais têm nomes muito bonitos, inspirados no céu e na Terra: Estrela Vera, Estrela Porã, Estrela Tovy, etc...

E chora São Pedro e em seu choro reflete: que saudade deve ter o pobre homem de sua primeira, aconchegante, quente e confortável residência, “Era uma casa muito engraçada / Não tinha teto não tinha nada”...

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